Nuclearização do Irã e a Tendência de Proliferação Nuclear no Oriente Médio Sob a Luz da Teoria dos Jogos

Este artigo aplica a teoria dos jogos para modelar, de forma racional e sequencial, as decisões estratégicas de Irã, Israel, Estados Unidos, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Egito e Turquia diante da possibilidade de nuclearização iraniana. A partir da construção de uma matriz de payoffs e da modelagem de jogos extensivos, examina-se como a aquisição de armas nucleares pelo Irã impactaria o equilíbrio regional e alteraria os incentivos estratégicos dos principais atores. A análise revela que a consolidação de uma capacidade nuclear iraniana tende a desencadear uma corrida armamentista no Oriente Médio, dada a percepção de ameaça existencial entre potências rivais. O artigo propõe, ainda, uma simulação do caminho racional que cada ator tenderia a seguir diante dos diferentes cenários estratégicos possíveis, contribuindo para a compreensão das dinâmicas de proliferação e dissuasão na região.

ANÁLISES

Leonardo Vicelli - Economista - Cientista Político

6/25/202533 min ler

Nuclearização do Irã e a Tendência de Proliferação Nuclear no Oriente Médio Sob a Luz da Teoria dos Jogos

Resumo

Este artigo aplica a teoria dos jogos para modelar, de forma racional e sequencial, as decisões estratégicas de Irã, Israel, Estados Unidos, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Egito e Turquia diante da possibilidade de nuclearização iraniana. A partir da construção de uma matriz de payoffs e da modelagem de jogos extensivos, examina-se como a aquisição de armas nucleares pelo Irã impactaria o equilíbrio regional e alteraria os incentivos estratégicos dos principais atores. A análise revela que a consolidação de uma capacidade nuclear iraniana tende a desencadear uma corrida armamentista no Oriente Médio, dada a percepção de ameaça existencial entre potências rivais. O artigo propõe, ainda, uma simulação do caminho racional que cada ator tenderia a seguir diante dos diferentes cenários estratégicos possíveis, contribuindo para a compreensão das dinâmicas de proliferação e dissuasão na região.

Palavras-chave: Teoria dos Jogos, Proliferação Nuclear, Oriente Médio, Equilíbrio de Nash, Jogos Sequenciais.

Sumário

  1. Introdução

  2. Fundamentação Teórica
    2.1 Teoria dos Jogos nas Relações Internacionais
    2.2 Equilíbrio de Nash e Jogos Sequenciais
    2.3 Particularidades do Oriente Médio: Religião, Regimes e Instabilidade
    2.4 Dinâmicas Temporais e Interdependências Estratégicas

  3. Metodologia
    3.1 Justificativa Metodológica
    3.2 Modelo Estático: Matriz de Payoffs e Equilíbrio de Nash
    3.3 Modelo Dinâmico: Jogos Sequenciais Extensivos
    3.4 Critérios de Atribuição de Payoffs
    3.5 Limitações da Abordagem

  4. Análise dos Cenários e Modelos Estratégicos
    4.1 Explicação Detalhada da Matriz de Payoffs e Critérios de Atribuição
    4.2 Nuclearização Regional como Consequência da Inação: Um Irã Nuclearizado sem Contenção Direta

    4.3 Racional Estratégico da Proliferação Nuclear com Base na Matriz de Payoffs

    4.4 O Caminho Racional dos Atores

    4.5 Jogo Extensivo: Análise Sequencial do Cenário Irã Nuclearizado sem Contenção

    4.6 Jogo Extensivo: Modelagem Sequencial do Cenário Mais Provável Segundo os Payoffs

    4.8 Subjogo Pós-Ataque

    4.7 Comparação Estratégica entre os Dois Cenários Modelados

  5. Conclusão Geral

Referências

1. Introdução

A possibilidade de nuclearização do Irã representa um dos dilemas geopolíticos mais complexos da contemporaneidade, com implicações diretas para o equilíbrio estratégico do Oriente Médio e para a credibilidade do regime internacional de não proliferação. Ao ultrapassar o limiar nuclear, o Irã alteraria profundamente a arquitetura regional de segurança, desencadeando reações estratégicas de atores-chave como Israel, Estados Unidos, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Egito e Turquia. Este artigo busca compreender, por meio da teoria dos jogos, como esses atores tenderiam a se posicionar diante da consolidação de um Irã nuclearizado e quais caminhos racionais emergem sob diferentes configurações de payoffs estratégicos.

Utiliza-se, para tanto, a construção de uma matriz de incentivos e a modelagem de jogos extensivos, a fim de simular cenários com e sem contenção, considerando o comportamento racional de cada ator diante de riscos assimétricos. A teoria dos jogos fornece as ferramentas formais necessárias para projetar trajetórias estratégicas dominantes, avaliar equilíbrios subgame perfeitos e compreender as dinâmicas de ação e reação entre os envolvidos.

Diferentemente do equilíbrio estratégico que prevaleceu durante a Guerra Fria, sustentado pela lógica da destruição mútua assegurada (Mutually Assured Destruction – MAD), o Oriente Médio apresenta dinâmicas distintas que desafiam os pressupostos clássicos da dissuasão nuclear. Na região, fatores como estruturas teocráticas de governo, narrativas ideológicas de natureza messiânica e a centralidade da religião nas decisões de Estado tornam o comportamento dos atores menos previsível e mais suscetível a ações de alto risco. A racionalidade estratégica, nesses casos, pode ser distorcida por motivações identitárias ou existenciais, dificultando a estabilização de um equilíbrio dissuasório e ampliando o risco de escalada não intencional.

O presente estudo parte do pressuposto de que a obtenção bem-sucedida da bomba pelo Irã, sem contenção direta, não apenas consolida sua posição estratégica, como também desencadeia uma lógica de proliferação regional. Através da teoria dos jogos, busca-se demonstrar como a ausência de resposta imediata altera os incentivos dos demais atores e leva à reconfiguração do equilíbrio regional. Ao longo do trabalho, serão modeladas as decisões possíveis e os caminhos racionais seguidos por cada ator, permitindo não apenas antever os riscos, mas também sugerir alternativas estratégicas de contenção coordenada.


2. Fundamentação Teórica

2.1 Teoria dos Jogos nas Relações Internacionais

A teoria dos jogos é um instrumento analítico amplamente empregado no estudo das relações internacionais para examinar interações estratégicas entre Estados e atores não estatais. Desenvolvida inicialmente por Von Neumann e Morgenstern (1944), e posteriormente refinada por Nash (1951), esta teoria analisa situações onde o resultado das decisões de um ator depende diretamente das decisões tomadas por outros atores (Axelrod, 1984). Em contextos de segurança internacional, especialmente relacionados à proliferação nuclear, a teoria dos jogos permite avaliar como Estados racionalmente calculam riscos e recompensas em suas estratégias políticas e militares (Powell, 2002).


2.2 Equilíbrio de Nash e Jogos Sequenciais

O equilíbrio de Nash refere-se a um conjunto de estratégias em que nenhum jogador pode melhorar seu resultado unilateralmente, assumindo que os outros jogadores mantenham suas estratégias constantes (Nash, 1951). Esta abordagem estática é útil para entender situações de dissuasão nuclear, nas quais atores buscam estabilidade estratégica por meio da ameaça mútua (Schelling, 1960). Por outro lado, jogos sequenciais incorporam uma dimensão temporal, permitindo análises que consideram movimentos condicionais e observáveis, além da possibilidade de ameaças críveis e compromissos irrevogáveis. A aplicação dessa abordagem dinâmica auxilia a compreender processos de escalada militar e proliferação nuclear em tempo real (Dixit & Nalebuff, 1991).


2.3 Particularidades do Oriente Médio: Religião, Regimes e Instabilidade

O Oriente Médio possui características únicas que impactam diretamente a racionalidade estratégica dos atores estatais e não estatais da região, especialmente em temas ligados à segurança e à proliferação nuclear. Diferentemente de outras regiões do sistema internacional, onde doutrinas como a destruição Mútua assegurada sustentaram décadas de equilíbrio estratégico, como durante a Guerra Fria, o Oriente Médio é marcado por um padrão crônico de instabilidade, rivalidades identitárias profundas, e disputas travadas por meio de guerras por procuração (Gause, 2014; Huntington, 1996).

As chamadas proxy wars — conflitos indiretos nos quais potências regionais ou globais apoiam militar, financeira e logisticamente grupos locais para defender seus interesses estratégicos — são a manifestação mais recorrente dessa lógica. A longa e sangrenta Guerra Irã-Iraque (1980–1988) simbolizou não apenas uma disputa territorial e política, mas também um embate ideológico entre o nacionalismo secular iraquiano e o islamismo revolucionário iraniano. Já no Líbano, o Irã projeta sua influência por meio do Hezbollah, grupo armado xiita que atua como seu representante direto no Levante, desafiando Israel em múltiplos episódios, como na guerra de 2006 (Byman, 2005; Berman, 2009).

A Guerra Civil Síria, iniciada em 2011, tornou-se um dos exemplos mais complexos de guerra por procuração do século XXI. O regime de Bashar al-Assad é apoiado por Teerã e por milícias xiitas do Iraque e do Líbano, enquanto grupos rebeldes receberam apoio direto e indireto de países sunitas como Turquia, Arábia Saudita e Qatar, além de envolvimento das potências ocidentais (Phillips, 2016). Esse conflito evidenciou como o Oriente Médio pode rapidamente tornar-se palco de disputas armadas transnacionais, cujos atores seguem agendas religiosas e estratégicas simultâneas.

No Iêmen, a disputa entre os rebeldes houthis — apoiados logisticamente pelo Irã — e o governo central apoiado por uma coalizão liderada pela Arábia Saudita representa uma extensão direta da rivalidade xiita-sunita. Os houthis utilizaram drones e mísseis fornecidos ou inspirados por tecnologia iraniana para atacar alvos estratégicos sauditas, demonstrando a capacidade de Teerã de influenciar guerras periféricas (Berman, 2009). Na Faixa de Gaza, o apoio iraniano ao Hamas e à Jihad Islâmica fortalece sua presença na arena anti-israelense, promovendo instabilidade crônica nas fronteiras do Estado judeu (Byman, 2005).

Além desses conflitos, destaca-se a natureza dos regimes políticos dominantes. O Irã é governado por uma teocracia em que o Líder Supremo combina autoridade religiosa e política, moldando decisões estratégicas de acordo com princípios doutrinários e não apenas com cálculos de custo-benefício tradicionais (Nasr, 2006). Essa fusão entre religião e Estado reduz drasticamente a previsibilidade do comportamento dos atores regionais e dificulta a eficácia da lógica de dissuasão nuclear.

Como argumenta Huntington (1996), em regiões onde os conflitos assumem caráter civilizacional, as disputas tornam-se intransigentes e não resolvíveis por simples barganha racional. No Oriente Médio, onde a fé desempenha papel central nas políticas externas de diversos Estados e na legitimidade de atores armados não estatais, a introdução de armas nucleares não apenas mudaria o equilíbrio de poder, mas criaria um ambiente onde decisões podem ser tomadas com base em motivações messiânicas, martírio ideológico ou interpretações religiosas de ameaça existencial.

Portanto, diante da experiência empírica de múltiplas guerras por procuração, da estrutura teocrática de poder em alguns estados e da centralidade da fé religiosa na formulação de políticas, o Oriente Médio configura um cenário no qual a introdução de armas nucleares representa uma ameaça sistêmica inédita. O risco de decisões estratégicas não lineares ou irracionais torna a dissuasão nuclear convencional insuficiente como garantia de estabilidade.


2.4 Dinâmicas Temporais e Interdependências Estratégicas

As relações estratégicas no Oriente Médio frequentemente ocorrem de forma interdependente e sequencial. Decisões tomadas por um país têm impacto direto nas percepções e escolhas subsequentes de outros atores regionais. Por exemplo, movimentos estratégicos iranianos relacionados ao desenvolvimento nuclear provocam respostas preventivas ou retaliatórias por parte de Israel, que por sua vez influenciam decisões de atores regionais como a Arábia Saudita e internacionais como os Estados Unidos (Jervis, 1978). Esta interdependência cria uma dinâmica complexa, onde cada ator precisa constantemente reavaliar suas estratégias em resposta aos movimentos percebidos ou antecipados dos demais. A compreensão dessas dinâmicas temporais é essencial para antecipar cenários estratégicos realistas e propor medidas eficazes de contenção e prevenção de conflitos nucleares regionais (Fearon, 1995).


3. Metodologia

3.1 Justificativa Metodológica

Este estudo adota uma abordagem metodológica baseada na teoria dos jogos, dada sua capacidade de analisar sistematicamente decisões estratégicas interdependentes em cenários complexos. A teoria dos jogos permite uma avaliação detalhada dos comportamentos racionais dos atores, revelando como decisões individuais impactam e são impactadas por expectativas sobre as ações dos demais jogadores (Axelrod, 1984; Powell, 2002). Dado o contexto de proliferação nuclear no Oriente Médio, essa metodologia mostra-se particularmente apropriada para identificar possíveis equilíbrios estratégicos e cenários de conflito.


3.2 Modelo Estático: Matriz de Payoffs e Equilíbrio de Nash

Inicialmente, construiu-se um modelo estático utilizando uma matriz de payoffs, baseada nas preferências estratégicas estimadas dos atores envolvidos: Irã, Israel, Estados Unidos, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Egito e Turquia. Os payoffs foram atribuídos com base em análises qualitativas da literatura acadêmica sobre segurança internacional, declarações oficiais, e padrões históricos de comportamento dos atores regionais (Schelling, 1960; Waltz, 2003). O objetivo principal desta matriz é identificar os equilíbrios de Nash, indicando combinações estáveis de estratégias em que nenhum ator se beneficia alterando unilateralmente sua decisão estratégica.


3.3 Modelo Dinâmico: Jogos Sequenciais Extensivos

Complementando o modelo estático, adotou-se uma abordagem dinâmica por meio da estruturação de jogos sequenciais extensivos. Essa abordagem permite a inclusão da dimensão temporal e a representação de decisões condicionais, em que cada movimento estratégico é condicionado pelas ações anteriores observáveis dos demais atores. Tal metodologia é essencial para avaliar estratégias credíveis, ameaças preventivas e respostas estratégicas efetivas em um contexto dinâmico e instável como o do Oriente Médio (Dixit & Nalebuff, 1991).


3.4 Critérios de Atribuição de Payoffs

Os payoffs atribuídos seguem uma escala ordinal padronizada, variando de -5 (resultado extremamente negativo) a +5 (resultado extremamente positivo). A escala foi definida levando em consideração fatores críticos como segurança nacional, estabilidade interna, ganho ou perda de prestígio regional e internacional, impacto econômico e risco existencial percebido por cada ator. As avaliações são fundamentadas em análises qualitativas, estudos históricos e relatórios estratégicos publicados sobre a região (Cirincione, 2021; Cohen, 2017).


3.5 Limitações da Abordagem

Apesar de sua robustez analítica, a metodologia escolhida apresenta limitações. A principal delas reside na premissa da racionalidade dos atores, assumindo decisões baseadas exclusivamente em cálculos estratégicos objetivos. Essa premissa pode não captar integralmente comportamentos influenciados por ideologias religiosas, percepções subjetivas de ameaças e lideranças autocráticas características da região. Além disso, a simplificação inerente à modelagem analítica ignora variáveis adicionais importantes, como pressões internas dos Estados, influência de atores não estatais e dinâmicas socioeconômicas mais amplas (Fearon, 1995).


4 Análise dos Cenários e Modelos Estratégicos

4.1 Explicação Detalhada da Matriz de Payoffs e Critérios de Atribuição

Esta seção dedica-se exclusivamente à apresentação, fundamentação e explicação detalhada da matriz de payoffs utilizada no modelo estratégico proposto. A matriz reflete cenários estratégicos possíveis envolvendo atores centrais (Irã, Israel e Estados Unidos), bem como atores regionais significativos (Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Egito e Turquia). A seguir, serão claramente explicitados os critérios utilizados para atribuição dos valores numéricos aos payoffs em cada cenário (Schelling, 1980; Bueno de Mesquita, 2010).

Critérios para a Atribuição dos Payoffs

Os payoffs são atribuídos em uma escala numérica que varia de -5 (perda máxima ou risco existencial) até +5 (ganho máximo ou hegemonia estratégica). Essa escala reflete a percepção estratégica relativa dos atores quanto aos custos e benefícios das ações possíveis, seguindo o princípio da racionalidade limitada dos agentes e a noção de preferências estratégicas consistentes (Waltz, 2012; Sagan, 1996).


  • +5: ganhos estratégicos máximos (hegemonia regional absoluta);

  • +3 a +4: ganhos estratégicos significativos (capacidade nuclear com efetiva dissuasão);

  • 0: status quo (sem ganhos ou perdas relevantes);

  • -1 a -2: perdas moderadas (instabilidade política ou diplomática limitada);

  • -3 a -4: perdas graves (redução significativa de influência estratégica);

  • -5: risco existencial ou colapso do regime político.


Matriz Completa de Payoffs


Justificativa Detalhada para Cada Ator Central e Regional na Matriz de Payoffs

Esta seção aprofunda a análise dos valores atribuídos aos payoffs de cada ator envolvido no jogo estratégico proposto, com base nos diferentes cenários prospectivos apresentados. O detalhamento visa conferir maior clareza sobre as motivações, percepções e implicações estratégicas por trás de cada número atribuído, reforçando a coerência lógica e o rigor analítico do modelo.

Irã

Cenário 1 – Recua (Status Quo): Payoff: 0
O Irã não avança em seu programa nuclear e, portanto, não sofre retaliação internacional direta. Mantém o status quo, mas sem obter ganhos relevantes de poder ou influência. A estabilidade é preservada, mas ao custo de renunciar a uma ferramenta estratégica importante, o que justifica o valor neutro.

Cenário 2 – Quase obtém a bomba e é atacado: Payoff: -4
Neste cenário, o Irã sofre um ataque preventivo (provavelmente liderado por Israel, com apoio logístico ou diplomático dos EUA) antes de consolidar sua capacidade nuclear. As perdas incluem danos significativos a instalações militares e infraestrutura, efeitos econômicos devastadores por sanções reforçadas e instabilidade interna. O valor -4 reflete essas perdas substanciais, ainda que sem configurar necessariamente risco de colapso do regime.

Cenário 3 – Obtém bomba sem ser atacado: Payoff: +4
O Irã alcança capacidade nuclear e evita uma guerra imediata. Ganha grande vantagem estratégica por deter um instrumento de dissuasão contra seus inimigos, ampliando sua influência regional e dificultando qualquer ação militar contra seu território. A pontuação elevada (+4) reflete o ganho geopolítico, mas sem atingir hegemonia plena, o que impediria um +5.

Cenário 4 – Obtém bomba e é atacado: Payoff: -5
Neste cenário extremo, o Irã é atacado mesmo após consolidar sua capacidade nuclear, desencadeando um conflito de escala total com possíveis consequências nucleares. As perdas humanas, materiais e institucionais seriam catastróficas, podendo ameaçar a sobrevivência do regime, o que justifica o payoff mínimo (-5).

Israel

Cenário 1 – Irã recua: Payoff: +4
Israel alcança sucesso estratégico com a não-proliferação, mantendo sua primazia nuclear na região e evitando conflito direto. A segurança nacional é reforçada sem custo militar, o que justifica o valor elevado.

Cenário 2 – Ataque preventivo: Payoff: -4
Israel opta por neutralizar o avanço iraniano via ação militar. Apesar de impedir o programa nuclear, arca com alto custo militar, possível retaliação direta, instabilidade interna e danos reputacionais internacionais. O valor negativo elevado reflete os riscos e custos associados.

Cenário 3 – Irã tem bomba e não é atacado: Payoff: -5
Esse é o pior cenário para Israel. Um Irã nuclearizado ameaça sua existência, rompe o monopólio estratégico israelense e torna mais arriscadas ações militares contra outros atores. O risco existencial justifica o menor valor da escala.

Cenário 4 – Irã tem bomba e há confronto: Payoff: -5
Um conflito direto envolvendo armas nucleares representaria o cenário de risco máximo para Israel, com potencial de aniquilação de grandes centros urbanos e perda irreparável de vidas civis.

Estados Unidos

Cenário 1 – Irã recua: Payoff: +4
Washington mantém sua posição de liderança na contenção da proliferação nuclear, preserva estabilidade regional e reforça alianças sem comprometer tropas. É um cenário positivo para seus interesses estratégicos e diplomáticos.

Cenário 2 – Ataque preventivo: Payoff: -2
Mesmo que não participe diretamente, os EUA sofrem desgaste diplomático global e com aliados europeus, além de enfrentar aumento da volatilidade nos preços do petróleo. Perdas são moderadas, refletindo o envolvimento indireto.

Cenário 3 – Irã tem bomba e não há resposta: Payoff: -3
Neste caso, os EUA perdem influência na região, veem seus aliados se sentirem ameaçados e abrem espaço para novos alinhamentos estratégicos. O valor negativo expressa essa perda de credibilidade e liderança.

Cenário 4 – Irã tem bomba e há confronto: Payoff: -4
Conflito direto ou regional envolvendo o Irã implicaria custos elevados para os EUA, seja em apoio militar a Israel, intervenções, ou pressão doméstica e internacional. Ainda que não seja um risco existencial, trata-se de um cenário de alto custo político e econômico.

Arábia Saudita

A Arábia Saudita, enquanto principal rival regional do Irã e autodeclarada defensora da ordem sunita, considera a aquisição de armas nucleares pelo Irã como uma ameaça direta à sua existência. Em diversas declarações oficiais, altos membros da monarquia saudita afirmaram que um Irã nuclear representaria um ponto de inflexão estratégico inaceitável, justificando inclusive uma corrida armamentista própria. Essa postura se insere em um contexto de rivalidade histórica e violenta entre ambos os países, frequentemente travada por meio de guerras por procuração, como nos conflitos no Iêmen, Síria, Iraque, Líbano e Bahrein, onde os dois Estados competem por influência geopolítica. O valor dos payoffs atribuídos aos cenários, portanto, deve refletir essa percepção intensificada de vulnerabilidade e a profunda desconfiança mútua entre os dois regimes.

  • Recuo do Irã: (+3) – Este cenário proporciona estabilidade regional e reforça a segurança saudita sem necessidade de escalada militar. Mantém o equilíbrio estratégico e previne uma corrida armamentista, o que é favorável à manutenção da ordem regional desejada por Riad.

  • Quase bomba e ataque: (-3) – A tensão atinge níveis elevados, com a Arábia Saudita em estado de alerta máximo para possíveis retaliações indiretas. Há risco de ataques assimétricos por aliados do Irã e aumento da pressão doméstica por fortalecimento militar.

  • Irã tem bomba e não há reação: (-5) – Este cenário representa um risco existencial direto para a Arábia Saudita, conforme reiteradamente declarado por autoridades da monarquia. Um Irã nuclearizado sem resposta internacional imediata altera de forma irreversível o equilíbrio estratégico regional, colocando em xeque a capacidade saudita de dissuasão e liderança no Golfo. O histórico de rivalidade sectária e geopolítica entre os dois países, marcado por confrontos indiretos em múltiplos teatros — como Iêmen, Síria, Iraque e Líbano —, indica que a posse de armas nucleares pelo Irã fortaleceria significativamente seus aliados e grupos por procuração, aprofundando a instabilidade regional. Esse novo patamar de poder projetado pelo Irã não apenas colocaria em risco a segurança territorial saudita, mas também a legitimidade e estabilidade interna da própria monarquia, justificando, assim, a atribuição do menor valor da escala de payoff (-5).

  • Irã tem bomba e há guerra: (-3) – Embora a Arábia Saudita possa não ser o alvo primário de um ataque direto, sua vulnerabilidade estratégica é elevada devido à proximidade geográfica, à ameaça de retaliações por grupos aliados ao Irã (como os houthis no Iêmen) e ao risco de ataques assimétricos contra sua infraestrutura energética. Além disso, a instabilidade generalizada gerada por um conflito dessa magnitude causaria prejuízos econômicos severos e aumentaria tensões internas, sobretudo em áreas de maioria xiita. Portanto, o valor -3 reflete um cenário de insegurança multidimensional, ainda que sem configurar risco de colapso total.

Emirados Árabes Unidos

  • Similar à Arábia Saudita, mas com menos influência direta. Seus valores refletem vulnerabilidade econômica (dado o peso da estabilidade para seus mercados), não militar.

Egito:

  • Payoffs moderados: sua posição é mais distante do eixo principal da rivalidade Irã-Israel. Os efeitos sobre o Egito seriam mais diplomáticos e internos, com risco de pressão social e deslocamentos diplomáticos regionais.

Turquia:

  • Ator ambíguo, interessado em manter a influência regional e evitar conflitos que fortaleçam o Irã ou os EUA. Seus payoffs refletem moderação: prefere estabilidade, mas é capaz de lidar com certos níveis de instabilidade calculada.

Este detalhamento reforça o realismo estratégico da matriz e sustenta a análise de jogos extensivos, ao considerar racionalmente os interesses, capacidades e riscos percebidos por cada jogador relevante no sistema regional.


4.2 Nuclearização Regional como Consequência da Inação: Um Irã Nuclearizado sem Contenção Direta

A obtenção bem-sucedida de armas nucleares pelo Irã, sem que haja uma resposta militar ou diplomática eficaz por parte de Israel, Estados Unidos ou potências regionais, representa um ponto crítico de inflexão no equilíbrio estratégico do Oriente Médio. Mais do que consolidar a posição regional de Teerã, esse cenário inaugura uma nova lógica de segurança regional, marcada pela incerteza e pelo incentivo à proliferação nuclear.

Historicamente, o equilíbrio entre potências nucleares foi sustentado pela lógica da destruição mútua assegurada (Mutually Assured Destruction – MAD), cuja eficácia pressupunha atores racionais, estabilidade política e canais institucionais de comunicação. No entanto, essas premissas não se aplicam integralmente ao contexto do Oriente Médio, onde rivalidades sectárias, regimes autoritários e a atuação de grupos armados não estatais comprometem a previsibilidade do comportamento estatal. A introdução de uma potência nuclear nesse ambiente volátil tende a gerar externalidades estratégicas intensas, provocando reações em cadeia por parte de outros Estados.

A Arábia Saudita constitui o caso mais emblemático. Autoridades do regime saudita já declararam publicamente que um Irã nuclearizado obrigaria Riad a buscar sua própria capacidade dissuasiva, rompendo com os compromissos atuais de não proliferação. Tal movimento encontra respaldo na relação histórica entre Arábia Saudita e Paquistão, país que já dispõe de arsenal nuclear e mantém vínculos militares e diplomáticos estreitos com o reino. Os Emirados Árabes Unidos, embora mais cautelosos, contam com infraestrutura nuclear civil avançada e poderiam reavaliar sua postura. Egito e Turquia, por sua vez, veriam com preocupação o deslocamento do centro de poder regional em favor do Irã, enfrentando pressões domésticas e geopolíticas para desenvolver projetos estratégicos equivalentes.

Além dos impactos sobre o comportamento dos Estados, a nuclearização iraniana sem contenção direta também fragiliza o regime jurídico internacional de não proliferação, especialmente o Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP). A ausência de consequências para um violador declarado da ordem vigente abre precedentes e estimula a dissidência normativa, comprometendo a legitimidade do regime multilateral.

Assim, a inação diante da ascensão nuclear do Irã não representa apenas um fracasso tático de contenção, mas sim a abertura de um ciclo de insegurança prolongada, com alto potencial de desestabilização regional e erosão das estruturas institucionais que sustentam a ordem internacional.


4.3 Racional Estratégico da Proliferação Nuclear com Base na Matriz de Payoffs

Para compreender a tendência de proliferação nuclear como consequência direta da nuclearização bem-sucedida do Irã sem contenção, é necessário articular uma sequência lógica baseada na matriz de payoffs apresentada anteriormente. Esta seção busca oferecer uma explicação de cunho analítico, ancorada nos pressupostos do realismo ofensivo e na racionalidade estratégica, sobre como a mudança no equilíbrio de poder regional resultaria em incentivos quase inevitáveis à proliferação nuclear (Waltz, 2012; Sagan, 1996).


O cenário de referência: Irã obtém bomba e não há reação (cenário 3 da matriz)

Neste cenário, o Irã alcança capacidade nuclear sem sofrer contenção militar ou diplomática significativa. O payoff atribuído ao Irã é de +4, representando ganho estratégico: dissuasão consolidada, incremento da influência regional e maior margem de manobra frente a adversários. Em contrapartida, os demais atores regionais e globais apresentam payoffs majoritariamente negativos: Israel (-5), Estados Unidos (-3), Arábia Saudita (-5), Emirados Árabes (-3), Egito e Turquia (-2). Este desequilíbrio explicita uma assimetria severa na distribuição de poder percebido, o que, sob a ótica da teoria dos jogos, configura uma situação de instabilidade estratégica (Bueno de Mesquita, 2010).


A racionalidade da reação: segurança como bem estratégico máximo

O princípio da maximização da segurança, fundamento do paradigma realista nas Relações Internacionais, indica que Estados submetidos a riscos existenciais ou perdas estratégicas severas tendem a reagir por meio de ações que restituam sua posição relativa no sistema. A matriz de payoffs revela que manter o status quo com um Irã nuclearizado representa um custo intolerável para Arábia Saudita e Israel (ambos com -5). Logo, sob essa ótica, o custo político, diplomático ou econômico de buscar armas nucleares passa a ser percebido como menor do que o risco de permanecer em desvantagem estrutural (Waltz, 2012).


O caso saudita: inevitabilidade da resposta

No caso da Arábia Saudita, o payoff de -5 reflete não apenas uma ameaça teórica, mas uma ameaça existencial explicitada em declarações públicas de líderes sauditas. A aliança estratégica com o Paquistão, que possui arsenal nuclear, torna tecnicamente viável a aquisição de armamento por meio de transferência ou desenvolvimento conjunto. A percepção de abandono por parte dos EUA, diante da ausência de contenção ao Irã, intensifica a pressão por uma resposta estratégica autônoma (Kahl, 2018).


Propagação regional: o efeito dominó racionalizado

A busca saudita por armas nucleares altera a matriz de incentivos regionais. Emirados Árabes Unidos, com payoff de -3, veem sua estabilidade econômica ameaçada. Egito e Turquia, com -2, não enfrentam riscos existenciais imediatos, mas a erosão de sua influência relativa e a reconfiguração do status regional impõem a necessidade de reequipagem estratégica. A proliferação, neste contexto, deixa de ser um desvio e se torna uma estratégia de contenção horizontal (Sagan, 1996).


Fragilização do regime de não proliferação

O cenário descrito compromete a eficácia normativa do Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP), ao estabelecer um precedente bem-sucedido de violação não punida. Isso reduz os custos reputacionais da proliferação e estimula a revisão de compromissos multilaterais por parte dos Estados regionais (Allison, 2004).


Conclusão

À luz da matriz de payoffs e da racionalidade estratégica que orienta a conduta dos Estados em ambientes anárquicos, a ausência de contenção à nuclearização do Irã não apenas desequilibra o tabuleiro regional, mas redefine os parâmetros de segurança no Oriente Médio. A proliferação torna-se, assim, uma consequência racional e quase inevitável, dada a assimetria de ganhos e perdas estratégicas identificadas. O modelo reforça que, sob certas condições, o equilíbrio de Nash entre atores regionais não está na manutenção do status quo, mas na disseminação da capacidade nuclear como forma de restaurar paridade.


4.4 O Caminho Racional dos Atores

Com base na matriz de payoffs previamente apresentada e na lógica estratégica delineada, é possível realizar uma projeção realista das ações mais prováveis de cada ator envolvido, assumindo comportamento racional orientado à maximização de ganhos e à minimização de perdas. Esta seção, portanto, não opera com futurologia especulativa, mas com inferência lógica fundamentada na teoria dos jogos.

O Irã: Incentivo Máximo à Nuclearização

Dentre todos os cenários analisados, o único em que o Irã apresenta um payoff estratégico positivo expressivo (+4) é aquele em que obtém a bomba nuclear sem sofrer ataque direto. Os demais cenários mantêm o status quo (0) ou implicam perdas severas (–4 ou –5), associadas à interrupção forçada do programa, colapso do regime ou derrota militar. Essa assimetria torna a busca pela bomba, de forma sigilosa e acelerada, a estratégia racional dominante. Observa-se que a obtenção da bomba amplia significativamente o payoff iraniano ao garantir dissuasão frente a ataques israelenses ou norte-americanos, reduzir a vulnerabilidade a sanções prolongadas e fortalecer sua posição regional frente a rivais como a Arábia Saudita. O custo de não nuclearizar, diante da ausência de garantias de segurança internacionais, se traduz em um retorno inferior no jogo. Ainda que o risco de ataque preventivo exista, esse risco é considerado administrável no cálculo do regime, sobretudo se os adversários não coordenarem uma resposta imediata e eficaz. Nesse contexto, o objetivo central do Irã é alcançar a capacidade de dissuasão antes que qualquer contenção ocorra, estabelecendo um “fait accompli” que minimize os custos de retaliação e maximize a influência estratégica (Waltz, 2012).

Israel: Dilema de Segurança e Probabilidade de Ataque Preventivo

Para Israel, dois cenários distintos compartilham o payoff mais negativo (-5): um Irã nuclearizado sem contenção e um confronto direto com um Irã já armado. A única alternativa com payoff positivo (+4) é o cenário em que o Irã recua. No entanto, este depende de ações externas. O cenário de ataque preventivo confere a Israel um payoff de -4, ainda negativo, mas menos catastrófico do que permitir a nuclearização iraniana. Isso indica que, na ausência de ação americana ou internacional eficaz, Israel tenderia racionalmente a adotar a estratégia do ataque preventivo, mesmo que com alto custo (Sagan, 1996).

Estados Unidos: Preferência pela Contenção Diplomática com Apoio Militar como Opção

Com payoff de +4 no cenário em que o Irã recua e valores negativos nos demais, os EUA possuem incentivo claro para manter o equilíbrio regional sem envolvimento militar direto. O cenário de ataque preventivo gera custo moderado (-2), enquanto um Irã nuclearizado não atacado implica perdas maiores (-3) e uma guerra aberta, ainda mais graves (-4). Portanto, a estratégia racional americana seria pressionar diplomaticamente e operar por dissuasão e sanções. No entanto, caso tais medidas falhem, os Estados Unidos tenderiam a apoiar uma ação israelense direta, seja com respaldo logístico, político ou operacional, tendo em vista que a nuclearização iraniana implica cenários de alto custo estratégico. A falha em conter o Irã comprometeria seriamente a credibilidade norte-americana junto a seus aliados regionais e poderia desencadear reações adversas em todo o sistema internacional (Allison, 2004).

Arábia Saudita: Pressão por Reação e Corrida Nuclear

O risco existencial expresso no payoff -5 para um Irã nuclearizado sem reação exige resposta estratégica. A alternativa mais provável seria a busca por armamento nuclear se Israel e EUA não atuarem de forma preventiva. A passividade deixaria a Arábia em posição de desvantagem estrutural intolerável (Kahl, 2018).

Demais Atores Regionais: Estratégias de Reequilíbrio Gradual

Egito, Turquia e Emirados Árabes, com payoffs entre -2 e -3, tenderiam a adotar estratégias mais cautelosas, porém orientadas a reduzir sua exposição: aumento do orçamento militar, pressão por acordos de segurança e início de programas nucleares civis dual-use. A ausência de reação internacional apenas reforça essa inclinação.

Conclusão da Projeção

A matriz de payoffs, ao espelhar as percepções de custo-benefício dos principais atores, permite prever com alto grau de racionalidade que:

  • O Irã continuará buscando armas nucleares.

  • Israel está disposto a agir preventivamente caso não haja contenção externa.

  • Os EUA tentarão conter via diplomacia, mas apoiariam Israel se necessário para evitar o pior cenário.

  • A Arábia Saudita reagirá com proliferação, se não houver ação.

  • Demais países se posicionarão para responder à nova configuração regional.

A lógica estratégica revelada pela matriz, portanto, sugere um cenário de escalada tensa e racional, cuja janela para prevenção diminui progressivamente à medida que o tempo passa sem resposta concreta à ambição nuclear iraniana.


4.5 Jogo Extensivo: Análise Sequencial do Cenário Irã Nuclearizado sem Contenção

Esta seção aplica a lógica do jogo extensivo para representar, em estrutura sequencial, as decisões estratégicas associadas ao cenário em que o Irã adquire armas nucleares com sucesso e não sofre contenção militar ou diplomática. A análise permitirá identificar os caminhos de ação racionais para os demais atores e a resultante instabilidade estratégica no Oriente Médio.

Estrutura Sequencial do Jogo

O jogo inicia com a decisão do Irã sobre desenvolver ou não uma arma nuclear. Caso opte por recuar, o jogo termina com estabilidade regional e status quo. Caso prossiga, o próximo nó é a reação da comunidade internacional — especialmente Estados Unidos e Israel.

Etapa 1: Irã decide

  • Recua: status quo, payoff neutro para todos.

  • Prossegue: caminha para obter arma nuclear.

Etapa 2: Reação internacional (EUA/Israel)

  • Contenção ativa: ataque preventivo ou sanções decisivas.

  • Não contenção: Irã obtém a bomba.

Assumindo o cenário projetado (não contenção), o jogo segue com os seguintes nós decisórios:

Etapa 3: Arábia Saudita decide

  • Adquire arma nuclear → payoff melhora de -5 para 0 ou positivo.

  • Mantém status quo → permanece em risco existencial.

Etapa 4: Emirados Árabes, Egito e Turquia observam

  • Iniciam programas nucleares próprios (dual-use ou declarados).

  • Aguardam novo equilíbrio, sob incerteza estratégica elevada.

Racionalidade das Escolhas

  • Irã: Tem incentivo máximo para seguir até obter a bomba (payoff +4), assumindo que não será atacado.

  • EUA/Israel: Na projeção em foco, ambos optam por não agir. Israel aceita payoff -5, o que não é racional a longo prazo, mas possível por inação temporária.

  • Arábia Saudita: Não tem alternativa racional a não ser iniciar sua própria nuclearização, buscando equilíbrio estratégico (Kahl, 2018).

  • Demais Estados: Copiam o movimento, mesmo com menor intensidade, para evitar marginalização estratégica (Sagan, 1996).

Resultado Final: Novo Equilíbrio Desestabilizado

O jogo termina com múltiplos atores buscando ou adquirindo armas nucleares, rompendo o monopólio de Israel e do TNP. O Oriente Médio passa de um sistema de dissuasão unipolar (Israel) para um ambiente multipolar nuclear incerto, altamente instável e com risco elevado de erro de cálculo ou escalada não intencional (Allison, 2004).

Conclusão

A análise extensiva revela que o cenário em que o Irã obtém armas nucleares sem contenção desencadeia, por via racional, uma proliferação em cadeia. A ausência de resposta no ponto decisivo inicial (Etapa 2) reconfigura todo o jogo subsequente, levando a um novo “equilíbrio” marcado pela insegurança coletiva e maior risco sistêmico.


4.6 Jogo Extensivo: Modelagem Sequencial do Cenário Mais Provável Segundo os Payoffs

Enquanto a seção 4.4 apresentou a projeção racional das escolhas estratégicas de cada ator com base na matriz de payoffs, a presente seção organiza essas decisões em uma estrutura sequencial formal, no formato de jogo extensivo. Essa abordagem permite visualizar a lógica interdependente das ações e reações dos principais jogadores envolvidos, destacando os pontos críticos da dinâmica estratégica.

Dando continuidade à projeção estratégica analisada na seção 4.4, esta parte desenvolve a estrutura de jogo extensivo correspondente ao cenário mais provável segundo os payoffs atribuídos aos principais atores. Trata-se da situação em que o Irã prossegue com seu programa nuclear, Israel realiza um ataque preventivo e os Estados Unidos fornecem apoio seletivo. Essa sequência de ações corresponde à configuração mais racional diante dos incentivos estratégicos analisados anteriormente.

Estrutura Sequencial do Jogo

O jogo inicia com a decisão do Irã sobre recuar ou avançar em seu programa nuclear. Caso opte pelo recuo, o jogo se encerra com manutenção do status quo. Ao prosseguir, ativa os nós seguintes:

Etapa 1: Irã decide

  • Recua: estabilidade mantida.

  • Prossegue com programa nuclear: caminho para dissuasão.

Etapa 2: Israel decide

  • Atacar preventivamente: impede a conclusão do programa nuclear.

  • Não atacar: Irã avança com risco crescente.

Dado o risco existencial associado à inação (payoff -5), Israel opta racionalmente pelo ataque. O jogo segue, então, com a resposta do Irã e a decisão dos Estados Unidos.

Etapa 3: Irã reage ao ataque

  • Retalia com força: escalada regional.

  • Recuo tático: preservação do regime.

Etapa 4: Estados Unidos decidem

  • Apoio direto a Israel.

  • Neutralidade estratégica.

Racionalidade das Escolhas

Esta modelagem segue os caminhos estrategicamente mais racionais conforme os payoffs avaliados. Israel, diante do risco máximo associado à inação, opta pelo ataque com custo menor. O Irã, atingido antes de completar sua dissuasão nuclear, deve escolher entre escalar ou preservar o regime. Os Estados Unidos, frente ao risco de erosão de sua influência e à necessidade de manter alianças estratégicas, tendem a oferecer suporte ao ataque israelense, direta ou indiretamente.

Reações Regionais

  • Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos: A ação preventiva reduz o risco existencial imediato e pode desacelerar seus próprios projetos de proliferação.

  • Egito e Turquia: Mantêm observação estratégica, ajustando seu posicionamento conforme os desdobramentos.

Implicações Estratégicas

Ao contrário do cenário de passividade, este caminho racional evita o desfecho mais desestabilizador. O custo da contenção é alto, mas menor do que os prejuízos potenciais de uma proliferação nuclear descontrolada na região. A lógica do jogo extensivo revela que, mesmo diante de incertezas, a antecipação militar se apresenta como a escolha dominante para os principais atores.

Considerações Finais desta Etapa

A estrutura do jogo extensivo deixa evidente que, diante da matriz de incentivos estratégica, o cenário mais provável — e racional — é o que envolve a antecipação do ataque israelense com apoio norte-americano. Essa decisão, ainda que arriscada, busca evitar a proliferação em cadeia e restaura uma forma de equilíbrio tenso, porém mais gerenciável.


4.7 Comparação Estratégica entre os Dois Cenários Modelados

Com base nas análises desenvolvidas nas seções anteriores, esta etapa tem por objetivo comparar os dois cenários estratégicos modelados em jogos extensivos: (1) o Irã obtém armas nucleares sem contenção, e (2) o Irã é alvo de ataque preventivo por parte de Israel, com eventual apoio dos Estados Unidos. A comparação considera não apenas os payoffs individuais, mas os desdobramentos sistêmicos, os riscos de escalada e os equilíbrios alcançados em cada caso.

Estabilidade do Sistema Regional

  • Cenário 1 (sem contenção): resulta em múltiplas reações regionais, com Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Egito e Turquia pressionados a desenvolver suas próprias capacidades nucleares. Cria-se um ambiente multipolar nuclear instável, com riscos elevados de erro de cálculo, proliferação horizontal e colapso do regime de não proliferação (TNP).

  • Cenário 2 (contenção via ataque): embora envolva escalada militar inicial, tem maior chance de reestabilização, pois interrompe o processo de dissuasão iraniana e desestimula reações em cadeia. Permite a manutenção do equilíbrio assimétrico existente (monopólio israelense).

Payoffs Agregados e Riscos Sistêmicos

  • Cenário 1: o Irã obtém o maior ganho estratégico individual (+4), mas o custo coletivo para os demais atores é severo (Israel -5, Arábia Saudita -5, EUA -3), com implicações negativas para a segurança internacional.

  • Cenário 2: os payoffs permanecem negativos (Israel -4, Irã -4), mas o sistema como um todo sofre impacto menor e evita o colapso normativo. Há custos militares e diplomáticos, mas menor incentivo à proliferação generalizada.

Probabilidade de Proliferação Nuclear Regional

  • Cenário 1: altíssima. A ausência de contenção ao Irã incentiva uma corrida nuclear regional, com risco de multiplicação de potências nucleares não consolidadas.

  • Cenário 2: baixa a moderada. A resposta preventiva sinaliza limites firmes à proliferação e reforça a eficácia dissuasória de coalizões internacionais.

Credibilidade Internacional

  • Cenário 1: perde-se credibilidade e capacidade de dissuasão, enfraquecendo alianças regionais e permitindo avanços geopolíticos de atores revisionistas.

  • Cenário 2: preserva-se a credibilidade por meio da ação, ainda que com custos reputacionais. Fortalece alianças e reafirma compromissos com a não proliferação.

Conclusão Comparativa

Embora ambos os cenários envolvam riscos significativos, a análise extensiva e os payoffs atribuídos revelam que o segundo cenário — ataque preventivo ao Irã — configura a opção mais racional e estável em termos de segurança regional e ordem internacional. Trata-se de um equilíbrio tenso, mas gerenciável, enquanto o primeiro cenário inaugura um ciclo de instabilidade com potencial de ruptura sistêmica.

A teoria dos jogos, ao permitir a simulação de interações estratégicas encadeadas, oferece evidência robusta de que a inação diante da ambição nuclear iraniana não é uma estratégia sustentável. O equilíbrio de Nash, nesse contexto, tende a se formar em torno da antecipação preventiva como mecanismo de preservação da ordem.


4.8 Subjogo Pós-Ataque

Dando continuidade ao modelo extensivo envolvendo Irã, Israel e Estados Unidos, este subjogo se inicia após um ataque preventivo por parte de Israel. A partir desse ponto, as decisões racionais se desdobram em uma cadeia de ações e reações, com consequências estratégicas significativas.


Tabela de Payoffs Estratégicos (Irã · Israel · EUA)

1 · Decisão inicial do Irã

  • Recuar (‑3)  →  perda de prestígio, instalações danificadas, mas regime preservado.

  • Retaliar (‑3 inicial)  →  alto custo imediato, porém mantém viva a chance de +1 (bomba) ou arrisca ‑5 (colapso).

Dado que recuar garante perda e retaliar ainda oferece pequena probabilidade de ganho, a resposta racional para Teerã é retaliar e acelerar o projeto nuclear.

2 · Bifurcação decisiva para os EUA

  • Neutralidade  →  duas saídas possíveis: guerra prolongada (‑2) ou, pior, Irã nuclearizado (‑4).

  • Intervenção total  →  possibilidade de queda do regime (+3).

Como +3 > ‑2 > ‑4, a estratégia racional americana é intervir militarmente se o Irã retaliar.

3 · Sequência racional resumida

  1. Israel ataca preventivamente (única maneira de evitar risco existencial).

  2. Irã retalia e tenta acelerar o programa para buscar o payoff +1.

  3. EUA intervêm para impedir a bomba e capturar o payoff +3.

  4. Dois desfechos terminais restam:

    • Colapso do regime iraniano → (‑5 · +3 · +3).

    • Irã completa a bomba (caso os EUA falhem) → (+1 · ‑5 · ‑4).

Conclusão do Subjogo

A racionalidade estratégica dentro deste subjogo aponta para uma trajetória clara:

  • O Irã retaliará e acelerará seu programa nuclear;

  • Israel e os EUA intervirão militarmente para conter o avanço.

O jogo tende a se encerrar em um de dois cenários extremos: a queda do regime iraniano por intervenção dos EUA, ou a conclusão bem-sucedida da bomba pelo Irã, caso a intervenção falhe.



5. Conclusão Geral do Estudo: Lições Estratégicas da Teoria dos Jogos para o Oriente Médio Nuclearizado

A presente pesquisa buscou compreender, à luz da teoria dos jogos, os desdobramentos estratégicos da possível nuclearização do Irã e suas implicações para o equilíbrio de poder no Oriente Médio. Ao construir uma matriz de payoffs racionalmente fundamentada e modelar os principais cenários em jogos extensivos, foi possível evidenciar que a dinâmica de decisões entre os atores regionais está fortemente condicionada por incentivos estruturais, riscos assimétricos e percepções de ameaça existencial.


A análise demonstrou que o cenário mais perigoso para a estabilidade regional e global é aquele em que o Irã obtém armas nucleares sem sofrer contenção, desencadeando um processo de proliferação em cadeia e elevando o risco de colapso normativo do Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP). Por outro lado, o cenário de contenção ativa, ainda que envolva custos significativos, aparece como a alternativa mais racional para evitar uma deterioração sistêmica.

A projeção estratégica com base nos payoffs indicou que os principais atores — Irã, Israel, Estados Unidos e potências regionais — tendem a adotar comportamentos que minimizem seus prejuízos relativos, mesmo que isso leve a confrontos. O Irã tem incentivo dominante para avançar, enquanto Israel e, em menor grau, os Estados Unidos, têm motivação estratégica para impedir esse avanço, ainda que a um alto custo político e militar. A Arábia Saudita, por sua vez, racionalmente buscaria sua própria capacidade nuclear caso a contenção falhe.

Importa destacar que a projeção racional construída com base no segundo cenário — em que Israel realiza um ataque preventivo com eventual apoio dos Estados Unidos — já se manifesta na prática. Em junho de 2025, Israel lançou ataques aéreos coordenados contra instalações nucleares iranianas em Fordow, Natanz e Isfahan, marcando o início de uma ofensiva regional de alto risco. Na sequência, os Estados Unidos ampliaram a operação com o uso de bombas bunker-buster contra alvos subterrâneos, assumindo participação militar direta. O Irã retaliou de forma ampla, com mísseis lançados contra bases americanas no Catar e no Iraque, posições israelenses nas Colinas de Golã e, significativamente, também contra áreas urbanas em Tel Aviv e Haifa, resultando em vítimas civis e danos à infraestrutura. Além disso, Teerã declarou sua retirada definitiva do Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP), intensificando a ruptura com a ordem internacional. Esses acontecimentos confirmam que a contenção ativa deixou de ser mera hipótese analítica e passou a representar a estratégia dominante. A racionalidade prevista nos modelos deste estudo encontra, assim, paralelo direto na realidade empírica recente, reforçando a validade da abordagem adotada.

O primeiro cenário abordado, no qual o Irã alcança armas nucleares sem contenção, representa não apenas um risco sistêmico sob a ótica da teoria dos jogos, mas uma ameaça concreta de proporções alarmantes. Ao desencadear uma corrida armamentista na região mais instável do planeta, onde conflitos sectários, guerras por procuração e rivalidades históricas já dominam o cenário geopolítico, tal trajetória expõe o mundo a um novo tipo de risco nuclear. Diferentemente de outras regiões marcadas por doutrinas de dissuasão equilibrada, como a Guerra Fria, o Oriente Médio apresenta um contexto único: nele, decisões estratégicas são frequentemente moldadas por fundamentos teocráticos, visões de mundo messiânicas e estruturas de poder guiadas por preceitos religiosos. A presença de regimes onde a fé molda diretamente as políticas de Estado torna a lógica da dissuasão nuclear menos previsível e mais vulnerável a escaladas irracionais ou sacrifícios autodeclarados em nome de causas sagradas. A mera possibilidade de atores com esse perfil deterem armamentos nucleares desloca o cálculo estratégico global para uma zona de incerteza inédita.

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